Você acha que ela está ali para lhe dar prazer e redenção, mas não há outra alternativa: ela é o que todos fizeram dela. É o fruto da realidade construída.
Ela não reclama e não lhe quer, mas te aceita.
Você faz pedidos, mas não a quer. Afinal, você só quer a si mesmo.
Só deseja ficar extasiado e satisfeito. Só quer parecer bem para os seus amigos. E basta.
Então você chega lá onde julga ser o auge. Quando julga ser o detentor do segredo dos prazeres.
Mas, não. Tu não sabes que mais cedo ou mais tarde, antes que você possa despertar e sair por aí, ela vai se apoiar ao seu ombro e dizer sutilmente em seu ouvido:
- Dê-me o que é meu.
- O quê? Eu não tenho mais tempo?! - você questiona.
Ela sorri irônica ao balançar a cabeça negativamente. Aquela expressão que, mesmo sem emitir som algum, diz muito.
Você entende, então. Entende, se aproxima e pede um beijo de despedida.
Sem êxito, você indaga com o olhar ela responde que só quer algo valioso de ti. E basta.
Você se aproxima para lhe entregar o dinheiro e ela se esquiva. Você insiste e ela sorri novamente.
- Não - ela diz - Seu pagamento é levar contigo tudo o que queria, mas não fez. Esse é o seu bem mais precioso com a Vida. O bem que tanto ignorou. Não sou sua amiga e não sou sua amante, porque não sou isso que você acha que sou.
- Como assim, porra?! Ainda não tive tempo pra fazer o que quero! Dê-me mais tempo, vadia!
Ela ignora.
- Você não se importa de ser chamada assim?! - você insiste.
Mas, novamente, ela dá de ombros e se levanta. Logo em seguida sai.
Silêncio e solidão: é a hora de ouvir os ecos de cada palavra emitida por ela. É a hora de perceber que tudo aquilo que havia sido dito era verdade, pois ela não existia. Não deveria existir.
Você logo se depara com algo estarrecedor: sempre ignorou o fato dela ser o que todos disseram e sua consciência não dizia.
Sempre ignorou que era míope e manco, pois não usava meus próprios olhos e pernas. O moribundo ali não era ela, a quem todos recorriam na busca pela satisfação e felicidade. Não! O moribundo sempre foi você, seu porco!
Um porco, sim. E fadado à Morte.
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